Artigo 88.º – Autorização de residência para exercício de atividade profissional subordinada

1 — Para além dos requisitos gerais estabelecidos no artigo 77.º, só é concedida autorização de residência para exercício de atividade profissional subordinada a nacionais de Estados terceiros que tenham contrato de trabalho celebrado nos termos da lei e estejam inscritos na segurança social.
2 — Mediante manifestação de interesse apresentada através do sítio do SEF na Internet ou diretamente numa das suas delegações regionais, é dispensado o requisito previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 77.º, desde que o cidadão estrangeiro, além das demais condições gerais previstas naquela disposição, preencha as seguintes condições:
a) Possua um contrato de trabalho ou promessa de contrato de trabalho ou tenha uma relação laboral comprovada por sindicato, por representante de comunidades migrantes com assento no Conselho para as Migrações ou pela Autoridade para as Condições do Trabalho;
c) Esteja inscrito na segurança social, salvo os casos em que o documento apresentado nos termos da alínea a) seja uma promessa de contrato de trabalho.*
3 — [Revogado].*
4 — A concessão de autorização de residência nos termos dos números anteriores é comunicada pelo SEF, por via eletrónica, à Autoridade para as Condições de Trabalho ou, nas regiões autónomas, à respetiva secretaria regional, de modo que estas entidades possam fiscalizar o cumprimento de todas as obrigações legais da entidade patronal para com o titular da autorização de residência, bem como à administração fiscal e aos serviços competentes da segurança social.
5 — O titular de uma autorização de residência para exercício de uma atividade profissional subordinada pode exercer uma atividade profissional independente, mediante substituição do título de residência, sendo aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo seguinte
O n.º 2 deste artigo 88.º foi alterado e o n.º 3 revogado pela Lei n.º 59/2017, de 31/07, quarta alteração à Lei de Estrangeiros, em vigor desde 07-08-2017.

Comentários
 
1  O art. 77.º estabelece as condições gerais de concessão de autorização de residência. No que a esses requisitos diz respeito remete-se para a anotação respectiva. Acontece que, com o fim dos vistos de trabalho e de estudo, que foram substituídos por títulos de residência com finalidades específicas, para além das condições gerais, exige a lei a verificação de condições especiais, em função da finalidade do título de residência que é requerido.
No caso das autorizações de residência para o exercício de actividade profissional subordinada, para além dos requisitos gerais fixados no art. 77.º exige-se apenas que o requerente, nacional de Estado terceiro, tenha contrato de trabalho celebrado nos termos da lei e esteja inscrito na segurança social.
A exigência de inscrição na segurança social afigura-se anómala nesta fase do processo. Sobre esta questão remete-se para a anotação 5 ao art. 77.º

2  O trabalho de estrangeiros em território nacional rege-se por normas constantes da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto (Código do Trabalho), regulamentada pela Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho. Domina neste âmbito o princípio da equiparação de direitos relativamente aos trabalhadores de nacionalidade portuguesa (art. 86.º do CT). O contrato de trabalho celebrado com cidadão estrangeiro, para a prestação de actividade em território português deve revestir a forma escrita (arts. 88.º, n.º 1, e 103.º, n.º 1, al. d), do CT), o qual deve ainda conter, de acordo com o preceituado no art. 158.º, n.º 1, da Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, as seguintes indicações: Nome ou denominação e domicílio ou sede dos contraentes; Referência ao visto de trabalho ou ao título de autorização de residência ou permanência do trabalhador em território português; Actividade do empregador; Actividade contratada e retribuição do trabalhador; Local e período normal de trabalho; Valor, periodicidade e forma de pagamento da retribuição; Datas da celebração do contrato e do início da prestação de actividade.
Dispõe ainda o n.º 2 do mesmo artigo que o trabalhador deve anexar ao contrato a identificação e domicílio da pessoa ou pessoas beneficiárias de pensão em caso de morte resultante de acidente de trabalho ou doença profissional.
O n.º 4 impõe ao empregador a obrigação de juntar ao exemplar do contrato que fica na sua posse documentos comprovativos do cumprimento das obrigações legais relativas à entrada e à permanência ou residência do cidadão estrangeiro em Portugal.
A entidade empregadora deve comunicar por escrito à Inspecção-Geral do Trabalho, antes do início da prestação do trabalho por parte de estrangeiro ou apátrida, a celebração do contrato, acompanhada de um exemplar do mesmo, impondo-se igualmente a comunicação da sua cessação, no prazo de 15 dias (art. 159.º da Lei n.º 35/2007, de 29 de Julho).
Nota SEF: A Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto e a Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, foram revogadas pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprova o Código do Trabalho. Sofreu sucessivas alterações, podendo consultar uma versão atualizada do Código do Trabalho no portal da PGDL.

3  O n.º 2 permite a flexibilização das condições de obtenção do título abrindo a possibilidade de dispensa de visto de residência, mediante proposta do director-geral do SEF ou iniciativa do Ministro da Administração Interna.
O facto de aqui se falar em proposta ou iniciativa destas entidades não arreda a possibilidade de tal se ficar a dever a impulso dos interessados, o que por certo constituirá a regra, visto até o disposto no art. 54.º, n.º 2, do Decreto Regulamentar n.º 84/2007, de 5 de Novembro, nos termos do qual eventual manifestação de interesse deve ser apresentada pessoal e presencialmente pelo requerente, no SEF.
A lei contempla tal possibilidade a título excepcional. Porém, indicando taxativamente os requisitos para a concessão da autorização nestes casos, o carácter de excepcionalidade fica de certa forma condicionado.
Esses requisitos são, para além dos restantes requisitos gerais previstos no art. 77.º, os seguintes: Posse de contrato de trabalho ou existência de uma relação laboral comprovada por sindicato, por associação com assento no Conselho Consultivo ou pela Inspecção-GeraI do Trabalho; Entrada e permanência legal em território nacional; Inscrição e situação regularizada na segurança social.
O universo das pessoas que podem ser abrangidas é o de muitos cidadãos que, sem título de residência, se encontram a trabalhar e têm a sua situação contributiva devidamente regularizada. Mesmo aqueles que não possam apresentar contrato de trabalho, desde que a efectiva existência de relação laboral seja comprovada através de alguma das entidades indicadas na al. a).
O único problema desta disposição tem a ver com a compatibilidade das exigências das als. a) e c), quando suponham o exercício efectivo de uma actividade por conta de outrem, com a da al. b). De facto, quem exerça uma actividade profissional subordinada não tendo visto de trabalho (obtido ao abrigo da anterior legislação), autorização de permanência (obtido também ao abrigo do regime anterior), visto de estada temporária para o exercício de actividade profissional subordinada de carácter temporário ou autorização de residência, não tem permanência legal em território nacional. Com efeito, nos termos do art. 181.º, n.º 2, "Considera-se ilegal a permanência de cidadãos estrangeiros em território português quando esta não tenha sido autorizada de harmonia com o disposto na presente lei ou na lei reguladora do direito de asilo, bem como quando se tenha verificado a entrada ilegal nos termos do número anterior".
Ou seja, uma permanência para efeitos de trabalho subordinado só é legal quando autorizada para tal finalidade, através dos mecanismos acima referidos, que hoje se reduzem ao visto de estada temporária ou autorização de residência para tal efeito. Fora desse enquadramento, a permanência será ilegal, nos termos da primeira parte da citada norma.
Pelo que a exigência de entrada e permanência legal terá que ser reduzida à entrada legal, sob pena de a norma não ter efeito útil. Sendo certo, por outro lado, que o legislador, ao prever a dispensa de visto relativamente a quem tenha uma relação laboral constituída, reduziu o critério de permanência legal ao requisito formal de cumprimento das normas relativas à duração de estada e sua prorrogação, abstraindo da sua finalidade.
É certo que a exigência de regresso ao país de origem para obtenção de visto, por parte de quem se encontre em Portugal e tenha já um contrato de trabalho, é imposição pouco atenta ao fenómeno da globalização e às condições de circulação das pessoas. Que para além disso marginaliza quem aspira a uma presença regular no mercado de trabalho, sequestrando na ilegalidade muitos imigrantes, que nessa situação aguardam eventuais processos ou facilidades de regularização.
Mas, por outro lado, é também de rejeitar um excesso de "cordialidade" da lei com a sua própria violação, nomeadamente quando a mesma se apresente excessivamente vantajosa em relação à via legal. É que de facto, a regularização por esta via tem ainda uma outra vantagem para além da dispensa de visto. Não está dependente do disposto no art. 59.º já que, como resulta do disposto nos n.ºs 3 e 4, não são as exigências do art. 59.º que condicionam a regularização, mas esta modalidade de regularização que condiciona o funcionamento do regime previsto no art. 59.º     O que constitui razão acrescida para recurso a este regime "excepcional".
Nesta questão o importante é encontrar um ponto de melhor equilíbrio, sob pena de um procedimento excepcional correr o risco de se transformar em normal. Até porque eventual sanção à entidade patronal, nos termos do art. 198.º, n.º 2, [atual 198.º-A, por força das alterações introduzidas pela Lei n.º 29/2012] é compensada pela poupança de eventuais despesas de afastamento, a que estaria obrigado nos termos da parte final do n.º 4 do mesmo artigo.
O art. 54.º do Decreto Regulamentar n.º 84/2007, de 5 de Novembro, pretende de alguma forma conter os abusos a que esta modalidade de regularização pode conduzir. Ao acentuar no seu n.º 2 o carácter oficioso do procedimento, salienta que a legitimidade para o mesmo depende de iniciativa do Ministro da Administração Interna ou de proposta do director-geral do SEF, conforme previsto na lei. E ao fazer radicar a excepcionalidade da situação em motivos de força maior, razões pessoais ou profissionais atendíveis (n.º 3), percepcionadas entre outros meios através de entrevista pessoal, circunscreve o âmbito de aplicação da norma, traduzindo num critério objectivável o aludido carácter de excepcionalidade. 

Nota SEF: A Lei n.º 29/2012 introduziu um n.º 5 a este artigo 88.º para sublinhar que o titular de uma autorização de residência para exercício de uma atividade profissional subordinada pode exercer uma atividade profissional independente, mediante substituição do título de residência, sendo aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 89.º, corporizando o cominado na alínea c) do n.º 1 do artigo 83.º que dita, em termos gerais: "... o titular de autorização de residência tem direito, sem necessidade de autorização especial relativa à sua condição de estrangeiro, designadamente:[...] ao exercício de uma atividade profissional independente;".

Nota SEF: Em 2017, as iniciativas do PCP (Projeto de Lei 240/XIII - Reposição de limites à expulsão de cidadãos estrangeiros do território nacional, alteração à Lei n.º 23/2007, de 4 de julho) e do Bloco de Esquerda (Projeto de Lei 264/XIII - Regularização de cidadãos estrangeiros, alterando também à Lei n.º 23/2007, de 04 de julho) mereceriam a aprovação da Assembleia da República por meio do Decreto da Assembleia 121/XIII (aprovando com alterações aquelas iniciativas, com votos contra do PSD e do CDS-PP; a favor do PS, BE, PCP, PEV e PAN). Traduziria a quarta alteração à Lei de Estrangeiros, publicada enquanto Lei n.º 59/2017, de 31 de julho, em vigor desde 7 de agosto, com implicações no regime de concessão de autorização de residência para o exercício de actividades profissionais, subordinado ou independente (artigos 88.º e 89.º), assim como nos limites à expulsão de cidadãos estrangeiros (artigo 135.º). A regularização da permanência por meio do  exercício de uma actividade profissional subordinada ao abrigo do n.º 2 deste artigo 88.º perde o carácter excepcional que trazia desde a redacção inicial da Lei de Estrangeiros e a possibilidade de dispensa da posse do (adequado) visto de residência deixa de ser proposta pelo diretor nacional do SEF ou por iniciativa do membro do Governo responsável pela área da administração interna. A manifestação de interesse que preclude o pedido de residência para ou pelo exercício de uma actividade profissional passa a ser possibilitada com a mera existência de uma promessa de trabalho. A permanência legal deixa de ser requisito para a concessão do direito de residência.
"A Lei dos Estrangeiros (Lei n.º 23/2007, de 4 de julho) foi modificada pela Lei n.º 59/2017, de 31 de julho e pela Lei n.º 102/2017, de 28 de agosto. Importa analisar as alterações levadas a cabo sucessivamente por estes dois diplomas. Enquanto no primeiro caso as mudanças da lei dizem respeito a iniciativas emergentes do debate nacional, as segundas destinam-se a transpor para o direito interno evoluções decorrentes do direito da União Europeia.
A) Lei n.º 59/2017, de 31 de julho
Embora não sejam em grande número, as modificações ao regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional são relevantes, incidindo sobre os pressupostos de alguns casos de regularização de situações administrativas ilegais e sobre a importante questão dos limites à expulsão. Importa, pois, atentar nas novidades destas alterações legislativas, as quais vieram responder a algumas necessidades de segurança jurídica e de efetivação da própria lei.
1. Em primeiro lugar, foram alterados os pressupostos de regularização dos imigrantes para efeitos de exercício de atividade profissional subordinada (artigo 88.º) ou independente (artigo 89.º).
1.1. No primeiro caso, referente a exercício de atividade profissional dependente, a alteração visou responder a uma situação já há muito contestada na prática, uma vez que o art. 88.º continha várias contradições que levavam à sua própria inaplicabilidade. De facto, os requisitos exigidos para a regularização, se interpretados literalmente, tornavam pura e simplesmente impossível essa mesma regularização. Entre os mencionados requisitos, exigia-se que o estrangeiro em situação irregular apresentasse prova da relação de trabalho subordinada. Ora, tal exigência era dificilmente compatibilizável com a proibição de emprego de cidadãos estrangeiros em situação irregular e respetiva punição. A coexistência destas duas normas no mesmo diploma levava ao conhecido efeito de “pescadinha de rabo na boca”: o estrangeiro que pretendesse regularizar a sua situação administrativa, necessitaria de contrato de trabalho. No entanto, dificilmente conseguiria obter tal contrato, já que o emprego de cidadãos estrangeiros em situação irregular é proibido e sancionado, pelo que dificilmente um empregador se sujeitaria a tal risco. A nova redação da alínea a) do n.º 2 do artigo 88.º veio, precisamente, responder à dificuldade exposta, já que passou a ser suficiente a apresentação de promessa de contrato de trabalho, para efeitos de regularização. Este documento é, pois, legitimamente tido como suficiente para comprovar que o imigrante irá desenvolver uma atividade profissional subordinada. Permite-se ainda que os interessados consigam procurar emprego de forma eficaz, evitando que os possíveis empregadores incorram em responsabilidade contraordenacional. Em conformidade com a nova possibilidade, o requisito referente à inscrição e descontos para a Segurança Social foi eliminado para os casos em que o interessado apenas dispõe de promessa de contrato de trabalho (al. c) do n.º 2).
1.2. As versões anteriores dos artigos 88.º e 89.º (esta última, sobre regularização para efeitos de exercício de trabalho independente) levantavam ainda um outro problema: exigiam, como pressuposto para a atribuição de autorização de residência, não só a entrada legal, mas ainda a permanência legal no território nacional. Se a necessidade de entrada legal se justificava com ointeresse de evitar o “efeito chamada” e o incremento da imigração clandestina, já orequisito referente à permanência ilegal carecia de qualquer sentido. De facto, com esse requisito apenas se levaria a uma regularização de imigrantes que se encontrassem, já, em situação regular, muito embora não dispusessem da autorização de residência para efeitos de atividade profissional (podendo dispor, contudo, de um outro estatuto administrativo qualquer). A esmagadora maioria dos cidadãos estrangeiros que se encontrassem à margem da lei, sem qualquer estatuto e, por isso, em situação de carência de acesso a serviços ou de obtenção legal de rendimentos ficava, pois, excluída. Este cenário levou a que a Administração procedesse a uma interpretação abrogatória desse requisito, fazendo-o, porém, num contexto puramente discricionário. Com efeito, muitas vezes recuperava a exigência da permanência legal quando o número de regularizações anuais começasse a ser excessivo.
A nova lei veio eliminar a referida necessidade de permanência legal no território. Tal eliminação constitui uma garantia da eficácia da própria lei, bem como de segurança e certeza jurídicas para os interessados. Os mesmos saberão, assim, que podem ter a situação administrativa regularizada, independentemente de possuírem ou não um qualquer estatuto, ou ainda independentemente da conjuntura migratória do momento. ..."

Jurisprudência      

1 - O regime excepcional de concessão de autorização de residência no país a cidadãos estrangeiros, previsto no art. 88.º do DL n.º 244/98, de 8 de Agosto (alterado pelo DL n.º 4/2001, de 10 de Janeiro), pressupõe que essa concessão se justifique por "interesse nacional".
2 - A expressão "interesse nacional" corresponde a um conceito relativamente indeterminado, cuja compreensão e extensão devem ser precisadas pela Administração.
3 - Nessa tarefa de preenchimento do conceito indeterminado, a Administração move-se a coberto da sindicância judicial, a não ser que os meios hermenêuticos usados ou os resultados atingidos sejam ostensivamente inadmissíveis.
4 - Não merece censura o acto administrativo que, por falta do referido "interesse nacional", recusou a concessão de autorização de residência a um cidadão ucraniano que exerce a profissão de pedreiro em Portugal, apesar de ele se mostrar socialmente bem integrado.
5 - Soçobra a denúncia de que o facto ofendeu os princípios da prossecução do interesse público, da igualdade e da imparcialidade em virtude de haver decidido o caso do recorrente de modo diverso de vários casos semelhantes, se no recurso se não descreverem minimamente esses outros casos que serviram de termo de comparação.
Acórdão do STA de 09-02-2005 - Processo n.º 02034/03

1 - Justifica-se a remissão para a fundamentação e decisão de acórdão anterior quando as questões postas ao Tribunal, em ambos, são idênticas e têm sido reiteradamente julgadas de modo uniforme.
2 - O Tribunal Pleno da secção do Contencioso Administrativo do STA não pode conhecer do vício de desvio de poder, arguido de modo autónomo, pela primeira vez, nas alegações do recurso jurisdicional para ele interposto.
3 - A concessão de autorização excepcional de residência ao abrigo do art. 88.º do DL n.º 244/98, de 8 de Agosto, consubstancia um poder discricionário da Administração, como tal apenas sindicável nos seus aspectos vinculados, designadamente os relativos à competência, à forma, aos pressupostos de facto e à adequação ao fim prosseguido e, quanto aos "limites internos" do exercício desse poder, designadamente o respeito pelos princípios da igualdade, justiça e imparcialidade.
4 - Na estrutura do n.º 1 do referido art. 88.º, o conceito de "interesse nacional" não descreve o pressuposto do exercício do poder discricionário, antes desempenha a função de indicar o fim específico a prosseguir, ou o critério da discricionariedade.
5 - O conceito "razões humanitárias" afere-se pelo quadro de valores constitucionais e convenções internacionais a que Portugal aderiu, sendo o acto administrativo na aplicação que dele se faça, sindicável pelo tribunal apenas em caso de erro grosseiro ou utilização de critério manifestamente inadequado.
6 - A recusa de autorização excepcional de residência a um estrangeiro, que em Portugal vem, trabalhando na construção civil, como servente, alegando que se viu forçado a abandonar o seu país de origem por aí não conseguir obter meios económicos que lhe permitissem viver acima do limiar da pobreza, não evidencia ter incorrido em erro grosseiro ou feito aplicação de critério manifestamente inadequado: por um lado, a actividade desenvolvida pelo recorrente, de carácter fungível e indiferenciado, não surge como especificamente relevante para a execução dos interesses essenciais que o Estado deve prosseguir quanto à existência, conservação e desenvolvimento da sociedade portuguesa; por outro lado, a emigração económica, provocada pela dificuldade de o interessado fazer a sua vida profissional, nos termos em que a projecta, no seu país de origem, por virtude da crise económica que alega ali existir, não é subsumível ao conceito de "razões humanitárias".
7 - Está devidamente fundamentado o acto de recusa de autorização excepcional de residência que, através de remissão expressa, se apropria da informação/proposta sobre que foi exarado, se desta constam, de modo claro, suficiente e congruente, embora sucintamente, as razões de facto e de direito que sustentam aquela decisão, possibilitando ao destinatário do acto a percepção de que a Administração considerou que os motivos por ele alegados para continuar a residir em Portugal são meramente individuais - ou seja, que interessam a ele próprio e não à colectividade nacional - e que não se provaram outros factos que pudessem constituir razões humanitárias.
- Para o acto se considerar fundamentado basta a indicação das razões por que se entende que no caso concreto do recorrente o interesse nacional não reclama a adopção de um regime excepcional de autorização de residência, não sendo exigível que a Administração enuncie, em abstracto, os casos em que, em seu entender, o interesse nacional justificaria a adopção desse regime excepcional.
Acórdão do STA 07-02-2001 - Processo n.º 044852

1 - O DL n.º 244/98, de 8 de Agosto, prevê no seu art. 81.º o regime geral de concessão a estrangeiros de autorização de residência em Portugal, em tudo idêntico ao que estava previsto no art. 55.º do DL n.º 59/93.
2 - No seu art. 88.º, aquele diploma contém um regime excepcional que, além dos casos abrangidos no conceito "reconhecido interesse nacional", já previstos no art. 64.º do diploma anterior, acolhe também o conceito "razões humanitárias".
3 - O conceito "razões humanitárias" afere-se pelo quadro de valores constitucionais, certas convenções internacionais e a Declaração Universal dos Direitos do Homem, enquanto o conceito "interesse nacional" se mostra de mais difícil aferição, sendo variável em função de circunstâncias históricas e de elementos políticos.
4 - Preenchidos tais conceitos, o controlo do acto foge ao tribunal, com ressalva das situações de "erro grosseiro ou manifesto" ou de utilização de "critério ostensivamente inadequado", e, obviamente, nos seus momentos vinculados.   
Acórdão do STA de 02-03-2000 - Processo n.º 044933

1 - O acto que denega o pedido de autorização de residência formulado ao abrigo do disposto no art. 64.º do Decreto-Lei n.º 64/93, não viola o referido preceito, se o requerente invocou apenas interesses individuais, designadamente más condições económicas no país de origem e a residência em Portugal de familiares.
2 - Não há qualquer obscuridade na fundamentação do acto referido em 1, se do mesmo consta que o pedido só poderia ser atendido em caso de reconhecido interesse nacional e os motivos invocados são meramente individuais.
Acórdão do STA de 23-06-99 - Processo n.º 044591

1 - O regime excepcional de concessão de autorização de residência consagrado no art. 88.º do DL n.º 244/98, de 8 de Agosto, consubstancia um poder discricionário da Administração, como tal apenas sindicável nos seus aspectos vinculados, designadamente, os relativos à competência, à forma, aos pressupostos de facto e à adequação do fim prosseguido.
2 - Não evidencia incorrer em erro grosseiro ou aplicação de critério manifestamente inadequado a recusa de autorização excepcional de residência a um estrangeiro que invoca, como fundamento do pedido, estar a trabalhar como pedreiro na construção civil, auferindo uma remuneração mensal certa, assim contribuindo para o desenvolvimento do país, e ter a sua vida estabilizada em Portugal, factos que não vão além do âmbito estritamente pessoal e que traduzem uma situação de normalidade e não de excepcionalidade, não sendo, como tal, subsumível aos conceitos de "reconhecido interesse nacional" e de "razões humanitárias".
3 - Está devidamente fundamentado o acto de recusa de autorização excepcional de residência que, através de remissão expressa, se apropria da fundamentação da informação/proposta sobre que foi exarado, se desta constam, de modo claro, suficiente e congruente, embora sucinto, as razões de facto e de direito que sustentam aquela decisão.
Acórdão do STA de 27-03-2003 - Processo n.º 0831/02 

1 - A decisão de conceder autorização excepcional de residência nos termos do art. 88.º do DL n.º 244/98, de 8 de Agosto, está dependente de "reconhecido interesse nacional" ou "razões humanitárias" expressões com acentuado grau de indeterminação que à Administração cumpre preencher em cada caso.
2 - Quando o requerente daquela autorização excepcional invoca casos que identifica, decididos favoravelmente pelo mesmo órgão, os quais considera iguais ao seu, a Administração, para indeferir, está vinculada a apresentar os elementos de facto dos respectivos procedimentos e ponderar se aqueles casos tinham efectivamente as mesmas características e a fazê-lo de forma que tenha o mínimo de demonstração objectiva no procedimento e, não o fazendo, desrespeita a vinculação que consiste na exigência de ponderação, imposta pelos arts. 266.º, n.º 1, da Constituição e 4.º do CPA, e a decisão está inquinada de violação de lei.
Acórdão do STA de 11-02-2003 - Processo n.º 0613/02 

1 - Produzidas alegações sem que tenha sido cumprida a especificação exigida pela al. a) do n.º 2 do art. 690.º do CPC, e tendo sido ordenada a notificação e notificada a recorrente para satisfazer essa exigência, sob pena de não conhecimento do recurso na parte afectada, não há que conhecer do mesmo no sector em que, na resposta a esse convite, continuou a verificar-se falta de cumprimento da exigência em causa, nos termos do n.º 4 do mesmo artigo, e tudo em conjugação com § único do art. 67.º do RSTA.
2 - A concessão de autorização de residência por razões humanitárias, nos termos do n.º 1 do art. 8.º da Lei n.º 15/98, supõe grave insegurança, e não "mera insegurança", sistemática violação dos direitos da pessoa e não mera ou esporádica violação desses direitos.
3 - Demonstrando nos autos que a requerente tem fundado receio de regressar ao seu país, por temer pela sua vida, em virtude de ser alvo de um grupo criminoso, que já matou o seu namorado, assassinato que presenciou e do qual conhece o autor material, e revelando-se ainda nos autos que no seu país, tanto à data da sua fuga como no momento da prolação do acto de indeferimento de autorização de residência, não havia condições normais de garantia do seu direito à vida, devem julgar-se verificados os requisitos do n.º 1 do art. 8.º, ainda que a violação dos direitos da pessoa humana não seja atribuída a uma acção directa das autoridades, antes a uma impossibilidade de as autoridades protegerem os seus cidadãos, e, no caso, a requerente, de acções determinadas de grupos criminosos organizados.
Acórdão do STA de 16-03-2004 - Processo n.º 01142/03
Fonte: SEF